8 de outubro de 2017

Manoel, Luiza e a história em comum com Arapiraca

A cidade, que completa 93 anos no final do mês, é cenário de milhares de histórias de um povo que se sente acolhido

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Árvore Arapiraca é considerada o marco referencial do Município

Arapiraca: árvore frondosa e acolhedora. A descrição aparece em vários relatos que contam a história do município e a origem do seu nome. Ela bem representa a relação da cidade com o povo que nela fez morada. A sua privilegiada posição geográfica, situada no centro do Estado de Alagoas, é um dos fatores responsáveis para que o município se destaque em relação aos demais do interior alagoano. Mas não somente.

Quem vem de outras cidades e se estabelece em Arapiraca, costuma apresentar o mesmo argumento, quando questionado sobre o fator motivador que o fez vir e permanecer no município: o de que se trata de uma cidade acolhedora e próspera.

Essa percepção remete ao episódio da chegada de Manoel André, vindo do povoado de Cacimbinhas, pertencente ao município de Palmeira dos Índios, em 1848, quando escolheu a árvore Arapiraca para descansar e acampar, em dia de sol e muito calor, segundo a tradição popular. Justamente por considerá-la frondosa e acolhedora.

“Essa Arapiraca, por enquanto, é a minha casa”, teria dito Manoel André. E esse seria o primeiro marco histórico e o referencial inicial da futura cidade, que recebeu o nome da árvore e tomou para si as suas características.  No mesmo ano fixou residência com a sua família, em terra comprada por seu sogro, Amaro da Silva Valente.

Relatos descrevem que Manoel André saiu de Cacimbinhas, Palmeira dos Índios, onde estava morando com a família da sua esposa, Maria da Silva Valente, motivado pela esperança de encontrar uma terra favorável para fixar residência e atender as expectativas de aumentar os seus rendimentos com a agricultura.

História de gente acolhida por Arapiraca

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Dona Luiza é um dos exemplos de quem se sente acolhida pela cidade

A história de Manoel André pode ser comparada com a de tantas outras famílias que, ao longo das décadas, chegou e fez morada na cidade. Um desses exemplos é Luiza Souza Ferreira, 95 anos, que também veio com a sua família do município de Palmeira dos Índios, mesma procedência do desbravador.

“A minha família morava em Palmeira dos Índios, quando os meus pais decidiram mudar para Arapiraca. Por lá, já se falava que a cidade era um bom lugar para viver e prosperar. Aqui eu cheguei pequena, cresci, casei e continuo vendo a minha família aumentar. Eu fui e sou muito feliz nessa cidade que considero minha”, conta orgulhosa, a dona Luiza.

Ela explica que veio com os seus pais, Maria Leite Souza e Domingos Cândido, e com mais seis irmãos, caminhando. A viagem, segundo ela, durou sete dias. As paradas no caminho eram estratégicas para comer e conseguir lugar para dormir. O tempo gasto com o percurso foi demorado por precisar seguir o ritmo das crianças. O grupo, apesar das dificuldades, contou com a generosidade de famílias que lhes deram acolhida durante as noites.

Lembranças

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Olhar fotos é um dos passatempos de dona Luiza, embora lamente não ter registros antigos

Entre as lembranças, histórias que viveu e outras que ouviu dos seus pais e irmãos mais velhos. Ela é a penúltima nascida e a única viva. Com 95 anos, lúcida e com saúde, comemora o privilégio de ainda recordar de detalhes do seu passado. Faz questão de explicar que a sua memória não é a mesma de antigamente, mas há as que não se apagam, a exemplo de pessoas, lugares, costumes e a formação de Arapiraca.

Quando senta para conversar, ela gosta de comparar como era o antes e o agora da cidade que viu crescer. Na ocasião da chegada da família da Dona Luiza à Arapiraca, passou a morar na área central, chamada de vila, onde atualmente está localizada a praça Manoel André. A casa era de taipa, aquelas construções também conhecidas de pau a pique, onde as paredes são erguidas com madeira, cipós e barro.

“Eu lembro que sempre morei na região do centro e vi ele se transformar. Antes era como um quadro, onde tinha casas e depois foi crescendo um comércio. Em todo lugar tinha muitas árvores e criações de animais. O transporte mais comum era o carro de boi. Quando começaram a aparecer os carros automotivos, muita gente corria, uns pra ver e outros pra se esconder, com medo. Dava pra contar nos dedos, agora não, é carro pra todo lado”, compara.

Dona Luiza diz que quase todo mundo se conhecia, o que facilitava os vínculos de amizade. “A família do Esperidião Rodrigues era uma das que conheci”, lembra ela, fazendo referência ao primeiro prefeito da Vila de Arapiraca.

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Estátua de Esperidião Rodrigues pode ser vista na praça Luiz Pereira Lima, no centro de Arapiraca

Quando jovem, gostava de ficar de conversa com a vizinhança, na frente da casa, costume preservado por muito tempo. Mas também tinha as obrigações de trabalho, desde cedo ajudava a família nos afazeres domésticos e na agricultura, principalmente na cultura do fumo.

“Toda vez que falo daquele tempo, quando trabalhava com fumo, vem a lembrança da minha mãe. Ela tinha o título de mais rápida destaladeira. E fazia o trabalho cantando, um costume das mulheres para distrair e adiantar o serviço. Também penso no meu marido, de quem sou viúva há 26 anos, quando também trabalhava com fumo e no ofício de marchante ”, comentou.

E entre as suas lembranças, há espaço para o colorido, o cheiro, texturas e a movimentação do povo na Feira Livre de Arapiraca, que até hoje acontece às segundas-feiras, atualmente no bairro Baixão, mas durante muito tempo no Centro. “A feira começou pequena e foi se espalhando por muitas ruas. É uma beleza e vem pessoas de todo canto. A gente encontra de tudo nas bancas, desde comida, roupas, animais, utensílios, ervas medicinais, móveis. E ainda tem aqueles homens que cantam emboladas. Uma riqueza”, destaca dona Luiza.

“Estou feliz em ver tudo acontecer e ter história para contar. Seis filhos, nascidos em Arapiraca, 16 netos e 14 bisnetos, todos com a vida encaminhada na cidade que minha família escolheu morar e eu nunca quis sair. Desse jeito, o que eu posso dizer dessa cidade, que é como uma mãe e acolheu a minha família e tantas outras? Tenho gratidão e amor por Arapiraca”, declarou dona Luiza, enquanto dizia estar em outubro, mês de aniversário da cidade.

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Painel que retrata a cena de Manoel André embaixo da árvore Arapiraca, no Museu Zezito Guedes

Praça Bom Conselho 

Largo Dom Fernando Gomes

Praça Marques da Silva

Praça Manoel André