13 de dezembro de 2018

Exposição “Cerâmica Hermética” reflete busca do homem por identidade

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Peças foram feitas na Cerâmica Santa Rita, em Lagoa da Canoa (Foto: Genival Silva)

Olhando para trás, é impensável que o homem chegou a escravizar pessoas cujo sangue nas veias era o mesmo.

Neste 2018, celebram-se os 130 anos do fim da escravidão no Brasil – o último país por essas bandas a fazê-lo, graças a heróis anônimos que deram suas vidas diariamente pela liberdade que se vivencia hoje.

Pensando nisso, o arquiteto delmirense radicado em Arapiraca, Rafael Gomes Brandão, idealizou um excêntrico projeto, inaugurado durante a primeira edição da Feira Literária de Arapiraca (Fliara).

A exposição “Cerâmica Hermética” está no salão principal da Casa da Cultura, na Praça Luiz Pereira Lima, no Centro, desde o mês passado e permanece até esta sexta-feira (14) até as 18h, com uma mensagem muito forte: nossas próprias raízes são desconhecidas.

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O traço de Rafael Gomes Brandão foi muito bem explorado nas obras,
contando com o apuro técnico da artesã mestra Nilvinha (Foto: Genival Silva)

Não apenas no tocante do oculto, mas por desfazimento cultural, a cultura negra por muito tempo foi tida como inferior, estigma carregado junto com todo esse processo escravista e inumano.

Aos poucos, esse cenário vem mudando e é o que explora Rafael com sua sensibilidade semiótica. Como o nome diz, a mostra carrega claras referências ao multi-instrumentista alagoano Hermeto Pascoal.

A inspiração veio da música “Slaves Mass” (em tradução livre, “Missa dos Escravos”), do álbum de mesmo nome lançado em 1976 que deu a ele ainda mais projeção internacional, e da canção “O Ovo”, de sua época na banda Quarteto Novo, lançada em 1967 no debut.

Segundo o arquiteto arapiraquense, na “Slaves Mass”, ele teve o intuito de concretizar a ideia de Hermeto que “homenageou os negros escravizados, bem como os perseguidos e presos políticos que, no Nordeste, eram torturados em troncos de barrigudas, submetidos à dor de seus espinhos robustos pelas ditaduras opressoras de um ontem não muito distante”.

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Esta mostra é uma erupção criativa de afirmação da identidade negra (Foto: Genival Silva)

Já em “O Ovo”, Rafael traz um sinônimo de vida, de um ressurgir, renascer, “de novas possibilidades de ser, como também pode simbolizar a transformação da matéria a partir das influências do meio, para o bem ou para o mal”.

“Essa exposição é o fruto de um trabalho a quatro mãos: as da artesã mestra Nilvinha e as minhas. Entre ovos e espinhos, homens engolem outros homens, entidades olham para o futuro e para o passado, pilares étnicos se apoiam. A estética e a mitologia negra arrematam as referências da coleção”, pontua Brandão.

Mestra Nilvinha é natural de Lagoa da Canoa, cidade onde nasceu Hermeto. O intento de Rafael foi tecer esse tecido de sonho e realidade, coincidências e destinos, arte e denúncia, sempre com a busca de identidade (sim, a identidade afro que todos temos em comum) como pano de fundo e tendo a textura da Cerâmica Santa Rita, local onde a artesã dá vida à memória dos que já foram e renascem enquanto metáfora. Enquanto luta.