Consciência plena com quietude e atenção: olhos fechados para uma mente aberta
Em um mundo cada vez mais barulhento, em que o tempo de estar só consigo é cada vez menor, o silêncio sinaliza que é preciso ouvi-lo. Parar por alguns minutos do dia e sentar-se de uma maneira confortável, com a coluna ereta e olhos semicerrados com a finalidade de se concentrar apenas na própria respiração é uma prática que tem se mostrado eficaz no enfrentamento de uma sociedade com níveis de intolerância e violência crescentes.
Esta observação interna apresenta-se fundamental para o resgate de uma vida mais consciente de suas ações individuais e coletivas, como explica o docente do Departamento de Medicina Preventiva da Escola Paulista de Medicina (Unifesp) e diretor do Mente Aberta – Centro Brasileiro de Mindfulness e Promoção da Saúde, Marcelo Dermazo.
“O ‘silêncio consciente’ significa silêncio com atenção plena e com uma atitude específica: curiosidade e abertura, que traduzimos como ‘mente do principiante’. Esse tipo de silêncio nos leva à introspecção e ao autoconhecimento, o que é especialmente importante nos dias de hoje em que estamos hiperconectados com o exterior e não com as nossas questões internas. Temos vivido no piloto automático, apenas reagindo às situações, sem poder de escolha”, pontua Dermazo.
Pesquisas do Laboratório Waisman para Imageamento Cerebral e Comportamento do Centro para Investigação de Mentes Saudáveis na Universidade de Wisconsin-Madison apontam que processos de interiorização melhoram o bem-estar geral, como também colaboram na redução de estresses biológicos que ocorrem no nível molecular.
“Há estudos que indicam, por sua vez, a redução de comportamento hostil, provavelmente porque estes métodos levam os indivíduos a observar melhor os estímulos, as respostas emocionais e a aprender com elas, em vez de automaticamente responder com uma explosão de raiva, por exemplo”, afirma a pesquisadora do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa do Albert Einstein, Elisa Kozasa.
A pesquisadora também destaca o papel de métodos de interiorização na construção da paz coletiva e seus benefícios para o desenvolvimento humano. “Existem muitos fatores que podem fazer a diferença para uma sociedade menos violenta. Mas, basicamente, se os indivíduos conseguem gerenciar melhor suas respostas emocionais e agir de forma mais construtiva, é esperado que a relação entre eles seja mais compassiva”, disse.
A interiorização na forma de uma prática meditativa, por exemplo, pode fazer com que a criança passe a se conhecer melhor, assim como seus pensamentos e sentimentos. Este processo de autoconsciência pode ajudar a desenvolver melhores estratégias para lidar com suas dificuldades e a se relacionar melhor com outras pessoas”, conclui.
A pesquisadora Kozasa possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo e pós-doutorado em Psicobiologia pela Universidade Federal de São Paulo. Suas principais pesquisas abordam a neurofisiologia de estados de consciência como a meditação, por meio da neuroimagem funcional, e a avaliação de intervenções que envolvem treinamento de habilidades cognitivas e comportamentais e que promovem uma melhor qualidade de vida e bem-estar.
Nestas áreas participou dos diálogos entre pesquisadores e o Dalai Lama, na interface entre efeitos de práticas contemplativas para a saúde em 2006 e 2011.
A interiorização e o cotidiano escolar
Na prática, a professora Telma Crescêncio Duarte, da Escola de Ensino Fundamental Voluntária Maria das Neves, em Arapiraca, já notou que o Momento de Quietude e Atenção é uma estratégia psicopedagógica da Metodologia Liga Pela Paz que tem feito a diferença em suas aulas.
“Além de ser um dos momentos de que meus alunos mais gostam, é uma hora importantíssima principalmente depois do intervalo, porque eles voltam para a sala muito agitados. Esse minuto de quietude ajuda a desacelerá-los. Eu consigo dar uma aula melhor quando eles se acalmam e, consequentemente, prestam mais atenção”, afirma Telma.
A metodologia faz parte do Programa de Educação Emocional e Social implantado há oito meses na rede de ensino municipal arapiraquense em parceria com a Secretaria de Estado de Prevenção à Violência (Seprev), prefeitura e organização Inteligência Relacional, e propõe essa conexão com a interioridade como método para relações mais tranquilas, consciência emocional e aulas com maior concentração e aprendizagem.