“Ser  palhaço é ser um denunciador da vida”. Com esta máxima, o Patrimônio  Vivo da Cultura Alagoana e mestre das Artes Circenses, Teófanes Antônio  Leite da Silveira, retratou que para ser um profissional do riso não  basta apenas se fazer piada.
 
O ofício de quem  busca a dentição plena, à mostra, é mais que filosofia barata. É um dom  exercido por quem mais conhece a alma humana.
 
Na  última passagem pelo município arapiraquense, o palhaço Biribinha, como  é conhecido seu personagem, trouxe a peça “Sem Você Eu Não Sou  Ninguém”. O enredo estava repleto de alegorias e metáforas, indicando  que o ser Teófanes não seria nada sem o humano Biribinha. E vice-versa.
 
Em  entrevista, ele mostrou a humildade que o levou ao topo do escalão no  Brasil, sendo referência para inúmeros atores e aspirantes no  picadeiro. 
 
Hoje, com mais de 50 anos de  carreira junto à família Silveira, Teófanes vive em Americana, interior  de São Paulo, local onde ocorrem circuitos contínuos de espetáculos do  segmento. 
 
Em 2014 inclusive, ele junto à  Companhia Turma do Biribinha recebeu o “Prêmio Cultural Destaque do  Ano”, na categoria Teatro, pelo presidente da Câmara de Vereadores de  Americana, Paulo Chocolate.
 
As reverências aos  seus feitos se dão também por meio de um trabalho profundo de pesquisa  que está sendo realizado por uma das maiores autoridades do país na Arte  do Circo, Verônica Tamaoki, com apoio da Fundação Nacional de Artes  (Funart).
 
Ela, que coordena o Centro de Memória  do Circo, em São Paulo, veio a Arapiraca colher depoimentos sobre a  vivência nos tempos do saudoso Circo Mágico Nelson, cujo proprietário  era o pai de Teófanes Silveira.
 
“É muito  importante este contato com as pessoas que puderam assistir e presenciar  toda a beleza daquele ambiente artístico. Precisamos preservar esta  memória da família Silveira”, diz ela, documentando tudo e entrevistando  músicos, artistas plásticos, assistentes de palco e todos que de algum  modo ajudaram a manter a lona daquele lugar erguida por tanto tempo.

 
O  Circo Mágico Nelson fez história em Arapiraca e Biribinha também deixou  sua marca. Hoje, há um espaço que atende mais de 700 crianças e  adolescentes da Rede Municipal de Ensino, que tem aulas de tecido,  acrobacia solo, corda indiana, malabares e arte da palhaçaria.
 
Localizada  no Bosque das Arapiracas – um dos mais belos cartões-postais da cidade  -, no bairro Santa Edwiges, a Escola Municipal de Circo Teófanes  Silveira tem, claramente, seu nome e seu filho, Nelson Silveira Neto,  como diretor.
 
O legado que Biribinha tem  conduzido é de uma importância sem precedentes. Um exemplo disso é um  espetáculo que ele e o palhaço Mixuruca (interpretado pelo seu outro  filho, Júnior Silveira) farão no Teatro Municipal de São Paulo nesta  quinta-feira (10).
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E ainda hoje, Dia do Palhaço, trazemos um bate-papo com o mestre circense, com cinco perguntas. Confira:
 
Pergunta.  Qual o significado cognitivo que o circo representa para você? E como  você o considera para uma criança – ou mesmo um adulto – que vai  assistir a um espetáculo?
 
Resposta. O  circo representa a minha própria vida! Foi nele que nasci, cresci e  continuo vivendo e aprendendo; ele é a minha universidade. Para uma  criança que vai a primeira vez, certamente será inesquecível – tanto  que, quando se tornar adulto, um dia levará também o seu filho e, assim,  entenderá melhor a felicidade de uma criança ao assistir a um  espetáculo circense.
 
Qual a primeira coisa que se recorda do circo de seu pai? Ele funcionou de que ano a que ano? Rodou o Nordeste todo? 
 
Ah,  a coisa que me vem logo à cabeça é o som do autofalante que ficava em  cima do mastro do Circo Mágico Nelson, reproduzindo músicas, como  “Pedacinhos do Céu” de Waldir Azevedo. Parece até que estou ouvindo  agora… Era lindo! Algumas vezes, eu, ainda com 7 anos de idade,  encostava o ouvido no mastro do circo e tinha a impressão que ouvia a  canção só para mim… Fui uma criança feliz! Meu pai fez o primeiro  circo em 1947, o segundo, em 1958, e o último em 1968, baixando de vez  sua lona em 1985, na Rua Bela Vista, em Arapiraca. Sim, circulamos todo o  Nordeste e seria difícil falar de uma região com nove estados  destacando algumas cidades, mas posso dizer que todas deixaram uma marca  importante na minha vida e da minha família.
 
O  quão importante acredita que seja este trabalho de memória e resgate  feito por Verônica Tamaoki? Certamente, um filme está passando pela sua  cabeça depois de tantos depoimentos de amigos, não?
 
Verdade.  Escolhi Verônica para contar nossa história por vários motivos. Um  deles foi pela competência de uma historiadora que ama o circo como sua  própria vida, a quem dedicou inteiramente a ele. Fará um belo trabalho,  tenho certeza! Os depoimentos irão contribuir de uma forma maravilhosa  nesse belo trabalho que tem ainda uma longa estrada pela frente.
 
Escolas  de Circo, como a de Arapiraca – que, aliás, leva seu nome – são a  solução para um maior contato dos jovens de hoje com a arte do  picadeiro?
 
Não só dos jovens, mas em  especial das crianças que, podemos dizer, representam a grande  ‘responsabilidade’ pela existência do circo… No aprendizado, que as  tornam artistas para manter a tradição cultural, e como espectadores,  para manter acesa a chama desta arte milenar.
 
O  que é ser palhaço para você? Seria representar a si mesmo de uma  perspectiva menos triste? O humor, decerto, é um dos vieses mais  críticos inventados pelo homem. Dá pra falar sobre tudo com ele.
 
Ser  palhaço é ser um denunciador da vida, expondo-se ao ridículo que se  assume para si, diante das mais complicadas situações que a sociedade  lhe impõe, e como representação simbólica de um povo, consegue “se  sair”… Pois bem, o palhaço é um homem pintado e um homem, um palhaço  sem se pintar.