Jornalistas arapiraquenses ganham prêmio nacional
Jornalistas arapiraquenses ganham prêmio nacional
Memorial resgata história da mulher no Agreste de Alagoas
Matéria de Davi Salsa e Mônica Nunes foi escolhida entre as três melhores de 2008
Reportagem produzida pelos jornalistas arapiraquenses Davi Salsa e Mônica Nunes, com o título “Memorial resgata a história da mulher no Agreste alagoano”, foi uma das três vencedoras do Prêmio Mário Pedrosa de Jornalismo – evento anual promovido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
A matéria, editada em novembro do ano passado, no jornal Tribuna Independente, foi escolhida entre os três melhores trabalhos sobre museus brasileiros, publicados na mídia nacional, no ano de 2008.
A reportagem destaca o conjunto de obras presentes no Memorial da Mulher Ceci Cunha, e o trabalho desenvolvido no espaço para resgatar a memória da mulher agrestina, a exemplo da criação de um acervo exclusivo para preservar a tradição centenária do canto das destaladeiras de fumo de Arapiraca.
O resultado do prêmio foi divulgado no última fim de semana, em Brasília. O Prêmio Mário Pedrosa é destinado a matérias jornalísticas sobre museus no Brasil, relacionadas ao tema -Museus como agentes de mudança social e desenvolvimento.
A relação com os nomes dos três vencedores do concurso foi publicada no Diário Oficial da União (Edição nº 39, Seção1, página 7).
Conforme prevê o regulamento do concurso, os jornalistas Davi Salsa e Mônica Nunes receberão um prêmio em dinheiro no valor de R$ 3 mil.
O jornal Tribuna Independente também receberá do Departamento de Museus e Centros Culturais do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Demu/Iphan) um diploma de menção honrosa pela contribuição à memória nacional.
De acordo com os critérios estabelecidos pelo edital do concurso, a Comissão Especial de Seleção, formada por jornalistas e museólogos, analisou aspectos relevantes como redação, edição e estruturação da matéria; pesquisa e documentação; profundidade da abordagem, multiplicidade de fontes; enfoque e fidelidade ao tema; caráter inovador ao tratar sobre o tema; construção da narrativa jornalística.
O Prêmio Mário Pedrosa surgiu no âmbito do Ano Ibero-Americano de Museus, comemorado em 2008, como forma de incentivar os meios de comunicação a divulgar trabalhos sobre museus e, no caso desta primeira edição, destacar a importância social das instituições museológicas.
O lançamento da segunda edição do prêmio está previsto para maio deste ano, com tema Museus e Turismo, o mesmo da Semana Nacional de Museus 2009, a fim de reforçar o apoio ao potencial turístico, atratividade, pluralidade cultural e diversidade das instituições museológicas brasileiras.
Veja a reportagem vencedora.
Memorial resgata história da mulher no Agreste de Alagoas
Repórter
(Colaboração da jornalista Mônica Nunes)
Arapiraca (Sucursal)-Elas já não queimam mais sutiãs em praça pública, mas o fariam de novo, caso necessário. Afinal, as lutas e vitórias femininas não têm limites.
Uma história deixada por lideranças que marcaram suas vidas, em busca de novas conquistas, sobretudo nas áreas social e política e que estão sendo resgatados no Agreste alagoano, com a implantação do Memorial da Mulher Ceci Cunha.
Inaugurado no dia sete de março deste ano, não por acaso na véspera do Dia Internacional da Mulher, o espaço funciona nas imediações do Parque Municipal de Arapiraca, sendo mantido pelo poder público local.
O memorial tem o nome da ex-deputada federal Ceci Cunha, uma das mais expressivas lideranças políticas de Alagoas e que foi brutalmente assassinada a tiros de espingarda.
Ceci Cunha faleceu no dia 16 de dezembro de 1998, momentos depois de ter sido diplomada deputada, em solenidade ocorrida no Fórum de Maceió.
A parlamentar foi executada juntamente com três familiares: o esposo Juvenal Cunha, o cunhado Iran Carlos Maranhão e a sogra da irmã, Ítala Neide Maranhão Pureza.
Conhecida como “Chacina da Gruta”, o crime ganhou repercussão nacional. Médica obstetra, Ceci Cunha foi a primeira mulher eleita para a Câmara Federal por Alagoas.
Para mulheres e homens
Dotado de moderna estrutura, o Memorial da Mulher abriga obras, documentos e relíquias que relatam a história da participação feminina na construção da história de Arapiraca e de outros municípios agrestinos.
A idéia é ultrapassar os limites da conservação de documentos, entrando na interatividade possível, via da Era Moderna, entrelaçando fatos do passado, presente e do futuro.
O Memorial da Mulher ocupa uma imponente localização na área de requalificação urbana do centro da cidade. É um dos únicos do País no gênero, com similar apenas no Rio Grande do Norte.
O espaço dispõe de auditório para 50 lugares, galeria, sala de reuniões, santuário, praça lateral e jardins. Sobre ele, um mirante com espaço para apresentações e transformado em área de lazer onde o público joga xadrez, jogo-de-dama, entre outras diversões.
Num toque bem feminino- e franqueado a todos- o local tem ainda um Café Cultural, com balcão para visitantes- disponível para a degustação de informações de temas voltados para a história da identidade feminina no município.
A visita ao mundo das mulheres também é possível através de painéis fotográficos e de documentários com relatos de personalidades femininas.
O memorial tem ainda parceria com grupos da sociedade civil organizada, a exemplo da Associação dos Idosos e das Empregadas Domésticas, além de secretarias de governo, escolas, entre outros segmentos sociais.
O local virou símbolo e uma justa homenagem do povo às mulheres que se destacaram em diversos segmentos da atividade econômica, social e política na região.
Canto das Destaladeiras escapa da extinção
‘Pisa Morena no caroço da mamona
você toma o amor das outras
mas o meu você não toma
Se tomar eu vou buscar
Pisa morena no caroço do Juá…’
A música ainda não é conhecida da indústria fonográfica -e tampouco toca nas rádios brasileiras- mas é, digamos, um hit entre os milhares de trabalhadores da agricultura de Alagoas e já vem sendo cantada em palcos de todo o País.
Os versos fazem parte de um conjunto de mais de 50 canções- já catalogadas- e que irão fazer parte do CD a ser lançado pelo Grupo de Destaladeiras de Canafístula – movimento cultural genuíno de Arapiraca, formado oficialmente no ano passado.
O álbum e um vídeo serão elaborados com recursos adquiridos por meio do Prêmio Culturas Populares, promovido pela Secretaria da Diversidade, do Ministério da Cultura, e que contemplou o Ponto de Cultura de Arapiraca “Cultura para o Desenvolvimento”.
O resultado desses trabalhos tem endereço certo e vai muito além dos fãs e admiradores que o grupo pretende conquistar: será entregue ao Memorial da Mulher Ceci Cunha.
“ Será um presente que elas mesmas irão dar ao local, ampliando o acervo e deixando registrando um pouco da história dessas mulheres que fizeram o progresso da cidade”, destacou a presidente da Associação de Moradores de Canafístula, Mariângela Lopes Barbosa, vista como um anjo-da-guarda entre as 20 destaladeiras-cantoras.
Mulheres como a senhora Angelina da Silva, 72, viúva, mãe de oito filhos. Aposentada, ela vivia, até então, em estado permanente de depressão. “ Todos os dias eu arrumava minha mortalha. Agora, eu nasci de novo”, desabafou.
Quem canta os males espanta
Hoje elas são, sem exceção, o retrato fiel da alegria e do entusiasmo. Duas vezes por semana ensaiam a coreografia e a voz. Na agenda, aulas de canto em escola de música patrocinada pela Prefeitura de Arapiraca. Tudo para aprimorar uma vocação natural nascida através do ofício de destalar e juntar as folhas de fumo.
A profissão, multiplicada na região, por conta da ascensão da cultura do fumo, era praticada em grandes salões que reuniam milhares de pessoas.
Numa jornada de trabalho que atravessava a madrugada, na época em que os rádios eram raros, era comum- e necessário- que surgisse algo que divertisse o grupo, mesclado por homens e mulheres.
Coube a elas, no entanto, a criação de uma espécie de brincadeira e que passou a ser levada a sério por quase quatro décadas. A partir de um mote nasciam os versinhos.
“ Podia ser a fome, uma namorico novo ou até uma briguinha”, explicou Ana Xavier, 62, destaladeira por mais de 50 anos e cantora do grupo desde sua fundação.
O canto, cantado na forma de quadrilhas, sextilhas ou até pé quebrado ( quando a rima não é obrigatória), ultrapassou anos, atravessou gerações, mas não resistiria aos novos ritmos da vida moderna.
A aplicação das leis trabalhistas, por exemplo. Afinal, já não é mais permitida a jornada de trabalho ampliada, a presença das crianças no trabalho e a chegada dos aparelhos eletrônicos trazendo músicas para os mais variados gostos musicais.
Mesmo resgatadas através do livro do historiador Zezito Guedes, denominado “As Cantigas das Destaladeiras”, as músicas estavam ameaçadas de extinção, pois não eram mais cantadas. Até que surgiu a primeira iniciativa de renascimento na Vila Fernandes, na zona rural de Arapiraca, e, mais recentemente, a do grupo de mulheres de Canafístula.
Felizes da vida, literalmente, elas cantam. Fazem isso sem cerimônia e sobre qualquer pretexto. Ainda como no passado, improvisam ou repetem a ladainha dos tempos em que Arapiraca era conhecida como a Capital Brasileira do Fumo.
Tempo em que elas, anonimamente, construíram essa história de desenvolvimento e progresso. Hoje, vestidas em figurino apropriado e produzido por elas, as arrancam aplausos – como na apresentação de Juazeiro, no Ceará.
Assim, mesmo com os dias contados para desaparecer dos salões de fumo, as cantadoras-destaladeiras trabalham pela preservação da espécie. Fazem isso através do Grupo de Canafístula e da formação de novos cantores formados pelo projeto Mestres da Cultura Popular Ação Griô, do qual Dona Angelina faz parte.
Nas escolas da rede pública municipal ela dá aulas de Cultura Popular e, mais ainda, de como é possível ser e fazer feliz através da arte. “ Hoje quero viver para cantar muito mais “, garantiu.
(Colaboração da jornalista Mônica Nunes).
(Colaboração da jornalista Mônica Nune