17 de outubro de 2016

Metodologia Liga Pela Paz e Educação no Campo transformam a relação dos alunos com a natureza

 

EDU CAMPO II

No abecedário da Escola de Ensino Fundamental Benjamin Felisberto da Silva, no povoado Gruta D’água, em Arapiraca, quase todas as palavras que exemplificam as 26 letras da língua portuguesa brotam da terra. Por lá, a vogal “A” é de alegria, mas também é da aromática arruda. A consoante “B”, além de dar o pontapé no substantivo bola, é largada para a palavra “brócolis”. E o “C” é claro que vem da cenoura, do coentro e assim por diante. As crianças, ainda, aprendem ao mesmo tempo os usos e benefícios de cada planta, legume e verdura.

Esse olhar para o campo, tendo por base e na prática escolar a agricultura sustentável, está no cerne da Escola, de zona rural, Benjamin Felisberto, que este ano ganhou uma importante aliada: a Metodologia Liga Pela Paz, programa de Educação Emocional e Social implantado há 8 meses na rede de ensino municipal arapiraquense, uma parceria da prefeitura da cidade com a Secretaria de Estado de Prevenção à Violência (Seprev) e a organização Inteligência Relacional (IR).

Ubiratan D’Ambrosio, um dos pensadores que inspiram a metodologia, fala que a Cultura de Paz deve contemplar a “paz total”. Isto é, a paz em todas as dimensões da vida, tais como: a paz individual, a paz social e a paz ambiental. A harmonia entre todas é fundamental para a sobrevivência da espécie e do planeta.

“Não podemos viver em conflito com o ambiente. Não é necessário elaborar muito para concluir que sem um ambiente sadio não pode haver continuidade da espécie. Educar para a paz é educar para a sobrevivência da humanidade – com dignidade. Esse é o nosso grande desafio”, afirma Ubiratan.

EDU CAMPO V

Em 2007, a Horta Comunitária da Benjamin Felisberto nascia. Surgiu a partir da necessidade de melhoria de vida das crianças e da comunidade Gruta d’Água. A saúde especialmente dos pequenos e a aprendizagem deles estavam indo mal, como conta a Edinalva Pinheiro, coordenadora da escola.

A Farmácia Viva, amostra do projeto Amanhã, voltado à capacitação de jovens agricultores de Arapiraca, é uma das iniciativas implantadas na Benjamin Felisberto por Edinalva como tentativa bem-sucedida de transformar a realidade da escola e também da Gruta.

“Fizemos uma pesquisa para saber como estava a cultura de plantas medicinais na Gruta D’Água. Em seguida trouxemos as mudas, chamamos o Conselho Escolar, os pais, os professores e fomos para a sala de aula mostrar que era possível fazer esse trabalho aqui e contextualizar o Projeto Político Pedagógico da escola com a Farmácia Viva”, conta.

Dois anos depois de um início turbulento, a escola implantou também o cultivo de legumes e verduras, que desde então enriquece a merenda das crianças. As plantas medicinais, mais que curar as dores da comunidade, passaram a ser do mesmo modo “companheiras” das hortaliças, pois elas evitam as pragas e com isso o uso de agrotóxicos, como explica passo a passo a coordenadora.

“Mão na massa”

Os 196 alunos do Ensino Infantil ao 5º ano, com o auxílio de monitores e professores, participam ora como observadores, ora colocando a mão na massa de todo o processo de preparo da terra, plantio e colheita. O excesso de legumes e verduras colhido é destinado às famílias dos discentes, até mesmo como uma maneira de estimular os pais a terem sua própria Farmácia Viva e horta em seus lares.

“Tudo isso ensinamos a eles. A aprendizagem das crianças melhorou bastante, porque atingimos diretamente a qualidade de vida da comunidade. Antigamente, esses meninos do campo não tinham costume de comer legumes e verduras. Era só o trivial: feijão, arroz, farinha”, diz Edinalva Pinheiro e destaca: “Eles até caderninho têm com tudo sobre as plantas medicinais que plantamos: se é pra dor de ouvido, se é pra dor de barriga, se é pra febre”.

EDU NO CAMPO VII

A chegada da Metodologia Liga Pela Paz foi um feliz casamento entre Educação do Campo e Educação Emocional e Social, pois tem transformado ainda mais a relação da escola com os alunos.

“Noto que as crianças estão mais amáveis, respeitando mais umas às outras. Fortaleceram os vínculos de amizade entre elas e o meio ambiente. Vejo um avanço muito grande no comportamento. Eles têm aprendido não só a cuidar da natureza, mas também a cuidar uns dos outros”, observa a professora do 4º ano, Welma Pereira Celestino.

EDU CAMPO III

Afinal de contas, tão importante quanto aprender português e matemática é aprender a lidar com os sentimentos e emoções e também a cuidar do Planeta Terra, e de quem e do quê o habita, em cada pedaço de sua esfera a ser preservada.

“É importante ser solidário com as pessoas e com a natureza, ter esse gesto de bondade. Se deixarmos a natureza morrer, a gente morre junto”, reflete Suellison Pereira, de 9 anos de idade.

EDU CAMPO IV

Edinalva Pinheiro, mais que coordenadora da Escola Benjamin Felisberto, uma líder comunitária e educadora da paz, finaliza: “Eu tento mostrar para os meus meninos e as meninas que é possível fazer a vida na roça, sem ter que se mudar para a cidade grande. O campo é minha vida. E pode ser a deles também”. As crianças de Edinalva, de alguma maneira, já sabem disso.